segunda-feira, 29 de setembro de 2025


O Tempo de Fernando em Mim: 11 Meses de uma Safra Permanente

Por Sônia Canto

 Em 29 de setembro de 2025, o calendário marca 11 meses da partida física de Fernando Canto, meu amor. Contudo, em meu universo particular, essa contagem cronológica é quase uma abstração. Longe de ser um vazio, cada dia que passa desde aquele 29 de outubro de 2024, tem sido uma imersão profunda nos rastros de sua alma, nos universos que ele tão poeticamente construiu. Eu, a quem ele carinhosamente chamou de 'Guardiã dos seus guardados', encontro-me em um espaço-tempo em que a ausência física se transmuta em uma presença que pulsa, indestrutível.

Ao aprofundar em seus escritos literários ou acadêmicos e seu vídeos particulares, relembro fatos que se apresentam como fio condutor do pensamento que ele exprimia até a culminância do seu propósito para a primeira leitura ou primeira publicação. Ele costumava falar comigo sobre seus projetos, de suas visões desde a ideia inicial até a conclusão. Eu costumava dizer a ele que eu era o seu “ouvido amigo”. Ele lia ou ouvia minhas expressões, às vezes de concordância, outras nem tanto. Na maioria das vezes dizia: “preciso que seja desta forma”, outras, “vou pensar melhor”. Eu só assentia.

Nesta jornada de imersão, deparo-me com textos inéditos até para os meus ouvidos – e confesso um sorriso em meio às lágrimas. Estes, estou organizando para novas publicações.

Estes tempos têm sido uma montanha-russa emocional. Meu coração se apequena quando leio uma mensagem escrita para mim e não enviada e, ao mesmo tempo, meu coração se avoluma de amor e carinho ao ver revelado diante de mim tanto afeto e dedicação escritos em palavras que só descobri nestes tempos de cumes e vales em que vivo hoje.

Nessa trajetória não há espaço para saudosismo e sim, creio eu, uma busca ativa para a efetiva compreensão do meu 'tempo hoje', a partir do 'tempo de Fernando'.

Em “Oppidum tempo”, publicado no livro Canção do amor enchente (2012), Fernando via o tempo como 'sombra que me experimenta/irredutível'. Nele, percebo a crueza da separação, mas também a força da inovação em lidar com essa inexorabilidade. O tempo que levou sua presença física é o mesmo que me inova na busca por sua essência.

Em 'temPO CInzA' (2014), onde a paixão é uma 'inscrição no granito' e o fogo 'jaz brando, oculto, mas vivo e bruto', vejo uma metáfora perfeita para o que sinto. Minha espera não é passiva, mas uma paixão ativa que se realimenta dos seus escritos, seus vídeos e seus rascunhos.

Nos versos de 'O tempo não conta para a eternidade' (também de 2014): 'Lírico e lento / Lapida em cinzel de sonho', percebo como essa visão de tempo, que transcende a cronologia, se manifesta em minha vida de agora. Meus sonhos, minhas memórias e meu amor por ele não são finitos.

É nos versos de 'Safra Permanente', poema que dedicou a mim, que encontro a mais poderosa das chaves para entender essa presença. Ele escreveu: 

Urge dizer a todos que te amo / e me alastrar, sôfrego, à tua procura diária / falar aos quatro cantos que o amor é necessário'. 

Não há ausência capaz de calar um amor descrito como 'profuso, é disseminador'. E mais: 

'O brilho desse amor estará preso ao laço que se ampliará conforme o tempo'. 

Entendo que Fernando, com sua visão poética, já antecipava que nosso elo nunca seria diminuído, mas sim ampliado e eternizado pela própria passagem do tempo, transformando a dor da perda em uma colheita contínua de amor.

Percebo que meu papel de Guardiã inclui dar continuidade aos escritos de Fernando, publicando seus textos, escrevendo sobre sua visão de mundo, o que confere a ele uma nova forma de existência.

Sei e sinto que, se o tempo é implacável, o amor é ainda mais potente, capaz de desafiar e redefinir a própria inexorabilidade.

E assim, enquanto o mundo mede os meses e os anos, eu mergulho na eternidade de Fernando. O tempo, que a princípio pareceu tão cruel, revela-se agora o cinzel que lapida a memória e o amor, transformando-os em uma 'safra permanente' em minha vida. Minha missão, como 'Guardiã dos seus guardados', transcende a custódia. É a de ser a ponte, o eco, a nova voz que permite que seus tempos estelares continuem a brilhar, eternamente em mim.

 

sábado, 20 de setembro de 2025

 

A Voz que Alça Voo: Celebrando Fernando Canto

Por Sônia Canto


Fala para o Lançamento do livro 'Um pouco além do Arquipélago onde acho que Deus mora’

É com o coração transbordando de emoção e gratidão que agradeço ao SESC, na pessoa do Sr. Ladislau Monte e equipe, a oportunidade nesta noite tão significativa.

Celebrar o Dia do Escritor em uma homenagem a Fernando Canto já seria por si só um privilégio. Mas esta noite é ainda mais especial, pois temos a honra de lançar 'Um pouco além do Arquipélago onde acho que Deus mora', o primeiro livro autoral póstumo deste gigante da literatura amazônida.



O Legado de Fernando Canto e a Essência do Livro

Fernando Canto foi, e continua sendo, uma voz singular em nossa literatura. Sua escrita, como as águas do Riomar que ele tanto amou, fluía com profundidade, lirismo e uma conexão visceral com a Amazônia. Este livro, 'Um pouco além do Arquipélago onde acho que Deus mora', é um testamento dessa essência. Ele próprio o descreveu como um 'apanhado de escritos' onde brota uma 'essência mística', uma 'constelação de palavras estreladas'.

O título já nos convida a uma jornada. O arquipélago, talvez a vida fragmentada, e o 'além', a busca pelo sagrado, pelo inatingível, pelo divino que se revela nos pequenos milagres do cotidiano. É um livro que nos guia pelo 'canto do pássaro prateado', uma metáfora luminosa para a liberdade, a poesia e a alma que alça voo, sem se prender às amarras do chumbo.

Aqui, Fernando nos presenteia com a amplitude de seu talento: prosa poética que nos embala, poemas que tocam a alma, e contos e crônicas que nos fazem refletir sobre a condição humana.

Ele nos leva a uma geografia pessoal, onde a 'Samaumeira' é uma mãe sagrada, onde os mitos de 'Ianejar' e as lendas da 'Sucuri' se entrelaçam com a realidade, e onde a própria Macapá, com seus '200 mil açoites', texto que publicou em 04 de fevereiro de 2022, em celebração aos 265º aniversário de Macapá, onde, segundo ele, aproximadamente 200 mil marés do Rio Amazonas lhe fustigaram a orla desde a fundação até aquela data, contando parte dos anos bissextos, se revela em sua resiliência e beleza.

Temas e a Relevância da Obra

Nestas páginas, encontramos a memória que 'nada secará', a reflexão sobre a vida e a morte, a crítica social sutil em 'O Peixe', e a celebração do amor como uma energia que 'transforma as leis do tempo em furtivas estrelas'. Fernando Canto nos convida a olhar para a nossa própria existência, para as forças que nos moldam, para a beleza da natureza e para a complexidade das relações humanas.

É uma obra que nos lembra da importância de 'desvendar' nossa terra, nossos sonhos, nossa alma, como ele tão poeticamente expressou em 'Urdidura (Enigma Amapá)'. É um convite a romper silêncios, a buscar a liberdade e a encontrar o sagrado em cada detalhe, em cada 'bilha que nos sacia a sede’.

 A emoção e o convite final

Assumir a tarefa de apresentar uma obra póstuma de Fernando Canto, um escritor de tamanha envergadura e sensibilidade, representou um desafio imenso. A ausência de sua voz para me guiar e a responsabilidade de honrar seu legado trouxeram consigo uma mistura de apreensão e reverência. Contudo, a profunda admiração por sua arte e a convicção na perenidade de sua escrita foram a força motriz que me impulsionou a este ato de coragem e ousadia.

Como bem pontua Yurgel Caldas, na apresentação, Fernando deixou o livro pronto, encadernado em espiral, coube apenas a tarefa de organizar o projeto gráfico com Silvio e Lulih, que foram especialmente profissionais, muito acolhedores e nos brindaram com este maravilhoso exemplar.

Fernando deixou explicito que o prefácio seria escrito pelo Professor Paulo Guerra, e assim foi. Explicitou dois amigos a quem ele queria dedicar poemas: Fernando Bedran e Carlos Lobato, e assim foi. Procurei deixar o projeto o mais próximo possível da concepção de Fernando Canto.

É com enorme emoção que entrego estas palavras e, mais importante, este livro ao público. Que cada página seja um novo encontro com a genialidade de Fernando Canto. Que sua voz continue a ressoar em nossos corações e em nossas mentes, e que 'Um pouco além do Arquipélago onde acho que Deus mora' seja um farol a nos guiar na dança das forças da vida.

Muito obrigada.

 


Fala proferida na fase final do I Festival de Música Universitária Fernando Canto, no dia 19/07/2025

Que honra e que emoção indescritível participar da apresentação final do I Festival de Música Universitária Fernando Canto – Voz e Instrumento na UNIFAP/Profid!

De 17 a 19 de julho, a universidade foi palco de um evento que celebrou a música em suas mais belas expressões: MPB, MPA (Música Popular Amapaense) e Gospel, reunindo acadêmicos, egressos, servidores e a comunidade em geral. 🎶

A cada performance, a cada nota, senti um carinho, um cuidado e um respeito impressionantes por parte da equipe técnica, brilhantemente liderada pelo Coordenador Prof. Dr.  Melque Lima, com o cerimonial impecável da jornalista Aline Ferreira. Vocês fizeram a diferença e tornaram essa experiência ainda mais emocionante e marcante! ✨

E a emoção foi ainda maior ao ver no júri ninguém menos que Osmar Jr., parceiro musical de longa data de Fernando Canto! No intervalo, ele nos presenteou com interpretações maravilhosas das canções "Assim como Raul" e "Farras & Cimitarras".

Foi um momento de pura nostalgia e celebração, especialmente sabendo que com essas músicas, Fernando Canto e Osmar Jr. foram vencedores do II Festival Amapaense da Canção em 1997 com "Farras & Cimitarras" (recebendo prêmios de Melhor Letra, Música Mais Popular e Melhor Intérprete), e do IV Festival Amapaense da Canção em 1999 com "Assim como Raul" (com prêmios de Melhor Letra, Música Mais Popular, Melhor Intérprete e Melhor Arranjo). Um verdadeiro atestado do talento e da parceria que marcaram época!

Este festival é muito mais do que uma competição; é uma homenagem viva à grandiosa e inspiradora trajetória de Fernando Pimentel Canto, um verdadeiro mestre e compositor amapaense.

Ao revisitar sua rica história, é absolutamente inspirador ver como Fernando Canto, desde sua participação no Conjunto Musical “FAMBER” em 1970, foi um pilar da música em nossa região. Sua jornada foi repleta de conquistas notáveis, como o 2º lugar no IV Festival Amapaense da Canção com a música “Devaneio” em 1972, e o cobiçado 1º lugar no VI Festival Universitário da Música Amapaense (FUMAP) em 1981, com a canção “Curriculum Vitae”, interpretada pelo saudoso cantor Manoel Sobral — uma conexão tão significativa com o espírito deste festival universitário!

Ele também marcou presença em concursos de composição, como em 1978, quando conquistou o 1º lugar no Concurso de Compositores do Amapá com “Joana Joá”. Sua colaboração em discos icônicos como “Marabaixo” em 1973 e sua participação fundamental com o Grupo Pilão em álbuns como “Quando o Pau Quebrar” (1986), “Na Maré dos Tempos” (1995) e “Trevelê” (1998), solidificam seu legado como um artista que não apenas criou e interpretou, mas também impulsionou e enriqueceu profundamente a cultura musical amapaense.

Estar ali, testemunhando a ascensão de novos talentos e sentindo a energia pulsante de cada apresentação, me encheu o coração de uma alegria e esperança imensas. Esta é a prova viva, palpável, de que o legado musical de Fernando Canto não se encerrou com sua partida em 29/10/2024. Pelo contrário, ele floresce e se reinventa nas novas gerações, ecoando com força e vitalidade em cada nova canção, em cada novo arranjo que surge, e em cada nova voz que se levanta e ecoa no palco da UNIFAP. 🎤💖

É uma oportunidade ímpar, e eu diria, essencial, de descobrir e incentivar esses talentos emergentes, garantindo que a chama da música continue acesa, vibrante e inspirando futuras gerações de artistas. Que a melodia atemporal e o espírito inovador de Fernando Canto continuem a ressoar em nossos corações e na rica tapeçaria da nossa cultura!

 


Registros

Bodas de carvalho

Hoje, 19/12/2024, Fernando e eu comemoraríamos 38 anos de casados. Seriam nossas bodas de carvalho. Diz o Google que as bodas de carvalho representam a sabedoria do casal que é usada para enfrentar as adversidades e os impasses da vida, eivadas de companheirismo, cumplicidade e parceria. Quis o destino que não completássemos os 38 anos de vida em comum, mas permitiu 37 anos, 10 dias e algumas horas. Sou só gratidão. Nesta trajetória fomos companheiros, cúmplices e parceiros, então, apesar da ausência física, estamos sim cumprindo nossas bodas de carvalho, pois ele vive em meu coração, no meu pensamento, na minha vida.

Em 1990, Fernando escreveu um livro chamado “Inserções num vazio equidistante”, e o dedicou a mim. Nunca foi publicado. A dedicatória: “À Sônia, este sumo. Seiva de golpe fundo.”

Ali está escrito:

TÉRMITA

Meu amor por ti

é teimoso

é roedor

é terno

Em cada 19 de dezembro, durante os anos que estivemos juntos, celebramos sem festas familiares ou com amigos. Nossa celebração tinha como testemunha o  Rio Amazonas, caudaloso, perene e nobre, onde nos dizíamos sobre nossa vida juntos, o que pretendíamos no ano vindouro. Sem alarde, momentos nossos, sem presentes, sem flor, apenas nosso amor se reinventando. Ali, nos prometíamos mundos e fundos e voltávamos pra casa mais juntos, mais serenos, mais cúmplices.

Eu, em muitos momentos, disse a ele, te amo além da vida. Ele me dizia, isto é profundo, mas só significa sempre. Eu te amo, sempre.

No mesmo livro, sobre as equidistâncias das inserções, diz:

Invernal e largo

como a noite

o teu vazio

ora germina

ora fenece

            instrumental

            cho ven do flor

Registros:

Eu: 19/12/2015:

Ah! O que dizer? Sempre juntos, amor... rumo a qualquer lugar, em qualquer circunstância... Colhemos estrelas no nosso caminho e as dispersamos em forma de bem-aventurança a todos quanto partilham conosco a alegria de viver o nosso amor. Sempre juntos, sempre um.

Ele: 19/12/2022:

Há 36 anos eu e Sonia Mont'Alverne Canto iniciamos nossa vida de casados, compartilhando o que surgiu durante esse tempo. A cerimônia foi na igreja ⛪️ de São Benedito. Nossos padrinhos foram Nazare Pacheco, Sérgio Aruana Elarrat, Beto Pacheco e Minha irmã Savina Canto, os dois últimos de saudosa memória. O padre foi Paulo Lepre e a Lúcia Uchôa Uchôa tocou magnificamente seu teclado. Obrigado, amor, por todos esses anos de convivência. Te amo. Sempre.

Eu aqui, hoje, amando Fernando Canto, além da vida e sempre.

quarta-feira, 30 de abril de 2025

O MISTÉRIO DO SILÊNCIO

 

Quando Deus responde com o silêncio
Deixa sempre um mistério na tarde
Talvez porque imprima em nuvens invisíveis mensagens
Que minha mente inepta
Não pode compreender.
Mas Deus só responde mesmo com silêncio às perguntas milenares, simples e sinceras.
Não às tolas ou as elaboradas por filósofos e por computadores que mergulham suas
Indagações nas questões astrais que buscam compreender sem ter a permissão do cosmo.
Acho que Deus responde, sim, à natureza
Das ondas do universo
E nós, humanos, fazemos arranjos complexos apenas para satisfazer os
Nossos desejos de tentarmos, em vão, imitá-lo.
(Poema de Fernando Canto)


Ao ler este poema de Fernando — “O Mistério do Silêncio” — sinto uma identificação profunda, como se cada verso traduzisse o que experimento nestes seis meses de ausência. O silêncio de Deus, que o poema descreve com tanta honestidade, passou a fazer parte dos meus dias, impondo-se não como vazio, mas como um mistério a ser respeitado.
Percebo nas entrelinhas a inquietação de quem busca respostas para o inexplicável, tentando decifrar sinais nas “nuvens invisíveis” ou encontrar sentido onde só há silêncio. Nesse tempo de luto, compreendi que não cabe à razão exigir explicações, e nem sempre a dor cabe em palavras, fórmulas ou argumentos — ainda que os filósofos e até os computadores tentem, como Fernando escreve, parar o universo para entendê-lo.
Hoje, percebo como o silêncio também responde: é no silêncio que sinto a natureza, as ondas deste universo que me permitem, vez ou outra, pressentir a presença do que partiu, e ainda assim permanece em mim. Neste poema, encontro um convite gentil a me render ao mistério, a aceitar que minhas lágrimas e minhas perguntas ficam diante de Deus, esperando não pela resposta falada, mas por serena aceitação.
Tal como Fernando expressou, reconheço minha “mente inepta” frente ao mistério. Mas aceito que parte do amor e do consolo está em não compreender tudo, percebendo — nesta poesia e no silêncio — a beleza discreta do que não se revela, mas toca o mais profundo de mim.
Hoje, como diria Fernando, estou desaguada. Que o desaguar seja também caminho de acolhimento, saudade luminosa e renovação — assim como ressoam nestes versos que encontrei em seus guardados — sem título —, guardados esses que o mistério do silêncio carrega.

P.S. Estes texto foi escrito em 29/04/2025, seis meses após a viagem de Fernando para o além.

Memória. Grupo Pilão 45 anos. Macapá Verão 2020

 


domingo, 27 de abril de 2025

Augúrio: Auspiciosa Semana

Encontrei este poema nos escritos de meu amor, Fernando Canto. 

Inicialmente, ao ler o título "Augúrio", imaginei algo como “agouro” ou equivalente; todavia, quase paradoxalmente, vi que o poema trabalha com a ideia de presságios positivos, utilizando símbolos como o voo e o canto das aves para anunciar dias melhores. A escolha do título "Augúrio" pode, de fato, evocar a ideia de "agouro", um presságio negativo. No entanto, o poema subverte essa expectativa, explorando o lado positivo da premonição. Essa dualidade entre o potencial negativo e a realização positiva cria uma tensão interessante, que se resolve ao longo dos versos, culminando em uma mensagem de esperança e otimismo. 
O eu lírico assume um tom profético, quase como um oráculo benevolente, que prevê felicidade, amizade e fraternidade. A repetição de termos como "profecia", "presságio" e "agouro" não apenas reforça o tema da premonição positiva, mas também evoca uma atmosfera de mistério e encantamento. Esses termos, carregados de significados ancestrais, transportam o leitor para um universo onde o futuro é vislumbrado através de sinais e símbolos. 
O poema é curto, composto por versos em forma de dísticos e quadras, com linguagem elevada e vocabulário ligado ao misticismo ("augúrio", "vaticínio", "predição"). Embora a métrica do poema seja irregular, essa característica contribui para um ritmo fluido e envolvente. As aliterações suaves, como em "voos… aves" e "sororidade… fraternidade", reforçam a musicalidade do texto, criando uma experiência sonora agradável e memorável. 
As imagens que o poema evoca são ricas em simbolismos. O voo das aves, por exemplo, pode ser interpretado como um símbolo de liberdade e ascensão, enquanto o canto representa a expressão da alegria e da harmonia. Esses elementos, combinados, sugerem uma jornada de transformação pessoal rumo a um estado de felicidade e plenitude.
A meu ver, o poema é um convite à esperança, enfatizando ações positivas ("boas palavras", "boas ações") como sementes para um futuro próspero. Há um tom didático na exaltação da coerência e da estima como antídotos para as "agruras" da vida.
O subtítulo "Auspiciosa Semana", creio, é uma pequena obra de encorajamento, onde a poesia funciona como um ritual de boas-vindas à felicidade. 
Ao escrever um poema, um conto ou uma crônica, Fernando sempre me pedia para eu escrevesse sobre as minhas impressões. Às vezes dizia, “é isto mesmo”. Outras, “estás equivocada, o que eu quis dizer é...”. Não ouso imaginar o que ele diria destas minhas impressões sobre este poema que li hoje, pela primeira vez.
Meu Fernando, como amo você.